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Recheio 2024 Institucional

Crónica de Hugo Sousa

Crónica de Hugo Sousa
Antes de mais, quero agradecer à revista Viva o convite para escrever uma crónica nesta prezada edição, embora fizesse mais sentido usá-la para pôr uma senhora sem roupa ao estilo dos pósteres dos anos 80, que os camionistas exibiam na sua cabine. Mas ok.
Estes pósteres fizeram parte de uma geração. Lembro-me que, nessa altura, não era uma prática exclusiva dos camionistas. Era extensível a sapateiros. Durante os meus quatro anos da primária (sim, juro que acabei em 4 anos!) na escola 37, percorria a rua de Costa Cabral todos os dias e passava pela loja de um sapateiro. Ele tinha um póster de uma professora com uma saia curta, decote e um quadro de xisto com a tabuada dos 6. Eu, como andava na 4.ª classe (equivalente ao 4.º ano nos dias de hoje) e estava prestes a mudar para um mundo novo (o equivalente ao 5.º ano nos dias de hoje), lembro-me de olhar para o póster da professora e pensar: “O sapateiro das duas, uma… Ou não sabe a tabuada dos 6 ou ficou mesmo com saudades da professora da primária.” Cheguei a casa e contei ao meu pai. Ele perguntou se eu também não iria ter saudades se a pessoa que me dá aulas todos os dias usasse aquela saia e aquele decote. Eu, sinceramente, acho que não. Até porque tinha um professor.
A rua de Costa Cabral foi a rua mais importante da minha infância. Para além de ser a rua da minha escola, era a rua do clube onde comecei a praticar desporto: o Académico Futebol Clube. A minha primeira investida foi no “desporto em patins” quando tinha 6 anos. Eu chamo-lhe “desporto em patins” porque o nome que lhe davam na altura era “patinagem” (equivalente a “rabichice” nos dias de hoje) . Eu perguntava: “Mas posso dizer que ando no hóquei?” E respondiam-me: “Não. Só podes dizer que andas no hóquei quando começares a jogar hóquei.” E isto não era muito confortável porque eu não tinha certezas de que aquilo me pudesse efetivamente levar ao hóquei. Isto porque o meu treinador da patinagem tinha os seus 20 anos e patinava muito bem. Dava piruetas no ar, rodava sobre si próprio, usava calças de licra muito justas, sabia fazer coreografias ao som de musica clássica e andava muito com os cotovelos junto ao corpo. Meus amigos, isto é um facto: eu nunca o vi treinar com a equipa de hóquei!! Na altura pensava: “Se aquele patina assim e não chega à equipa, estou feito ao bife! Nunca vou chegar ao hóquei!”
Mais tarde, aos 12 anos, na mesma instituição desportiva e a convite de um amigo da escola, entrei para o basquetebol. E aqui, devo confessar, senti-me em casa. Senti-me em casa porque quando estou em casa passo muito tempo sentado e era exatamente o que acontecia nos jogos.  Hoje em dia, percebo a opção do treinador porque, com 12 anos, já media 1,76 e não era responsável pelos meus próprios movimentos. Pôr-me em campo era como soltar uma girafa assustada numa feira. Por um lado era bom porque os adversários fugiam de mim, por outro lado era mau porque os meus companheiros de equipa fugiam de mim. Para o caro leitor ter uma ideia do nível da minha descoordenação, uma vez, sem querer, com um movimento brusco, abri a cabeça a dois ao mesmo tempo. E estava no balneário. Mas com a ajuda do meu treinador da altura (grande Hóracio!) lá consegui evoluir e atingir um bom nível de competição no basquetebol.
Na altura tinha o cabelo comprido e cheguei a ser capitão de equipa. Como usava uma fita, o meu treinador dizia que eu era o único capitão de equipa que ele conhecia que usava a braçadeira na cabeça. E eu orgulhava-me disso. Aliás, tinha muito estilo e muita gente me dava valor. Uma vez até pediram para tirar uma fotografia pelo facto de ser tão bonito. Foi o treinador da patinagem.

Hugo Sousa
Comediante de stand up

*Este texto não foi escrito ao abrigo do Novo Acordo Ortográfico{jcomments on}

Antes de mais, quero agradecer à revista Viva o convite para escrever uma crónica nesta prezada edição, embora fizesse mais sentido usá-la para pôr uma senhora sem roupa ao estilo dos pósteres dos anos 80, que os camionistas exibiam na sua cabine. Mas ok.

Estes pósteres fizeram parte de uma geração. Lembro-me que, nessa altura, não era uma prática exclusiva dos camionistas. Era extensível a sapateiros. Durante os meus quatro anos da primária (sim, juro que acabei em 4 anos!) na escola 37, percorria a rua de Costa Cabral todos os dias e passava pela loja de um sapateiro. Ele tinha um póster de uma professora com uma saia curta, decote e um quadro de xisto com a tabuada dos 6. Eu, como andava na 4.ª classe (equivalente ao 4.º ano nos dias de hoje) e estava prestes a mudar para um mundo novo (o equivalente ao 5.º ano nos dias de hoje), lembro-me de olhar para o póster da professora e pensar: “O sapateiro das duas, uma… Ou não sabe a tabuada dos 6 ou ficou mesmo com saudades da professora da primária.” Cheguei a casa e contei ao meu pai. Ele perguntou se eu também não iria ter saudades se a pessoa que me dá aulas todos os dias usasse aquela saia e aquele decote. Eu, sinceramente, acho que não. Até porque tinha um professor.

A rua de Costa Cabral foi a rua mais importante da minha infância. Para além de ser a rua da minha escola, era a rua do clube onde comecei a praticar desporto: o Académico Futebol Clube. A minha primeira investida foi no “desporto em patins” quando tinha 6 anos. Eu chamo-lhe “desporto em patins” porque o nome que lhe davam na altura era “patinagem” (equivalente a “rabichice” nos dias de hoje) . Eu perguntava: “Mas posso dizer que ando no hóquei?” E respondiam-me: “Não. Só podes dizer que andas no hóquei quando começares a jogar hóquei.” E isto não era muito confortável porque eu não tinha certezas de que aquilo me pudesse efetivamente levar ao hóquei. Isto porque o meu treinador da patinagem tinha os seus 20 anos e patinava muito bem. Dava piruetas no ar, rodava sobre si próprio, usava calças de licra muito justas, sabia fazer coreografias ao som de musica clássica e andava muito com os cotovelos junto ao corpo. Meus amigos, isto é um facto: eu nunca o vi treinar com a equipa de hóquei!! Na altura pensava: “Se aquele patina assim e não chega à equipa, estou feito ao bife! Nunca vou chegar ao hóquei!”

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Mais tarde, aos 12 anos, na mesma instituição desportiva e a convite de um amigo da escola, entrei para o basquetebol. E aqui, devo confessar, senti-me em casa. Senti-me em casa porque quando estou em casa passo muito tempo sentado e era exatamente o que acontecia nos jogos.  Hoje em dia, percebo a opção do treinador porque, com 12 anos, já media 1,76 e não era responsável pelos meus próprios movimentos. Pôr-me em campo era como soltar uma girafa assustada numa feira. Por um lado era bom porque os adversários fugiam de mim, por outro lado era mau porque os meus companheiros de equipa fugiam de mim. Para o caro leitor ter uma ideia do nível da minha descoordenação, uma vez, sem querer, com um movimento brusco, abri a cabeça a dois ao mesmo tempo. E estava no balneário. Mas com a ajuda do meu treinador da altura (grande Hóracio!) lá consegui evoluir e atingir um bom nível de competição no basquetebol.

Na altura tinha o cabelo comprido e cheguei a ser capitão de equipa. Como usava uma fita, o meu treinador dizia que eu era o único capitão de equipa que ele conhecia que usava a braçadeira na cabeça. E eu orgulhava-me disso. Aliás, tinha muito estilo e muita gente me dava valor. Uma vez até pediram para tirar uma fotografia pelo facto de ser tão bonito. Foi o treinador da patinagem.

 

Hugo Sousa

Comediante de stand up

 

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